OPINIÃO

O ACORDO MINISTERIAL PARA O AFASTAMENTO DO PROCESSO CRIMINAL NA JUSTIÇA MILITAR

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Jônatas Peixoto Lopes

A aplicabilidade do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) na Justiça Militar deve ser analisada à luz das alterações promovidas pela Lei nº 13.964/2019. Embora o instituto tenha sido incorporado ao Código de Processo Penal (CPP), sua aplicação aos crimes militares gerou intensa controvérsia doutrinária e jurisprudencial. Esse debate envolve não apenas a posição do Superior Tribunal Militar (STM), que inicialmente rejeitou sua incidência, mas também a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a possibilidade da celebração do ANPP para crimes militares de menor gravidade. Diante desse cenário, torna-se essencial avaliar o impacto dessa medida na eficiência da persecução penal e no respeito aos princípios fundamentais da hierarquia e disciplina, que estruturam a vida castrense.

A introdução do ANPP no ordenamento jurídico brasileiro decorreu da aprovação do Pacote Anticrime, que incluiu o artigo 28-A no Código de Processo Penal. No entanto, sua aplicação na Justiça Militar permaneceu incerta, pois o Código de Processo Penal Militar (CPPM) não foi expressamente modificado para incorporar esse instituto. Essa lacuna legislativa deu margem a interpretações divergentes, levando o STM, em um primeiro momento, a afastar sua utilização, sob o argumento da ausência de previsão expressa e da incompatibilidade com os princípios que regem o direito penal militar.

A relevância do tema reside na necessidade de harmonizar os princípios que orientam a Justiça Militar, especialmente hierarquia e disciplina, com a busca por maior eficiência na persecução penal. Nesse sentido, a evolução jurisprudencial tem desempenhado papel fundamental, culminando na decisão recente do STF, que passou a admitir a aplicação do ANPP nos crimes militares, desde que atendidos critérios específicos. Esse posicionamento representa uma mudança significativa e inaugura um novo paradigma na negociação penal no âmbito castrense.

A Justiça Militar possui um regime jurídico próprio, voltado para a preservação da ordem e da disciplina das instituições militares. No entanto, a ampliação do espaço para a justiça penal negocial levanta questionamentos sobre a compatibilidade desse modelo com os valores castrenses. Antes da decisão do STF, o STM fundamentava sua posição contrária ao ANPP no princípio da especialidade, que impede a aplicação subsidiária do CPP quando há norma específica na legislação militar.

Contudo, em abril de 2024, a Segunda Turma do STF reformulou esse entendimento, decidindo que, inexistindo vedação expressa, o ANPP pode ser aplicado na Justiça Militar, desde que sua utilização não comprometa os valores essenciais da estrutura castrense. Esse precedente abriu caminho para a negociação penal no contexto militar, garantindo maior flexibilidade na resolução de infrações de menor gravidade, ao mesmo tempo em que preserva a hierarquia e a disciplina.

A adoção do ANPP na Justiça Militar pode representar um avanço na eficiência da persecução penal, reduzindo o volume de processos e permitindo que os tribunais militares concentrem seus esforços nos crimes de maior gravidade. No entanto, sua aplicação deve ser criteriosa para evitar impactos negativos na disciplina militar. Entre as principais implicações dessa mudança, destacam-se:

Redução da sobrecarga judicial: Crimes de menor potencial ofensivo podem ser resolvidos sem a necessidade de processos longos e onerosos. Maior celeridade e eficiência: A possibilidade de um acordo extrajudicial contribui para um desfecho mais rápido e menos desgastante para os envolvidos.Preservação dos valores militares: A decisão do STF estabelece que o ANPP não pode ser aplicado de maneira indiscriminada, devendo ser analisado caso a caso para garantir que não comprometa a hierarquia e disciplina.

A recente decisão do STF sobre a aplicabilidade do ANPP na Justiça Militar inaugura uma nova fase no direito penal castrense. Embora a medida represente um avanço na racionalização da persecução penal, seu uso deve ser cauteloso e alinhado às especificidades da jurisdição militar.

Diante desse contexto, recomenda-se a criação de diretrizes claras para a aplicação do ANPP na Justiça Militar, garantindo que a negociação penal não comprometa os pilares fundamentais da estrutura castrense. A interação entre o Ministério Público Militar, o Poder Judiciário e as Forças Armadas será essencial para assegurar um equilíbrio entre a eficiência da justiça penal e a manutenção da disciplina e hierarquia militar.





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